
Após assistir aos discursos de diversos líderes mundiais na Cúpula de Líderes para o Clima, realizada hoje, ficamos com a convicção de que existe, ao menos aparentemente, o claro direcionamento da maioria das nações relevantes para a redução das emissões dos gases que provocam o efeito estufa, assim como a redução todas as atividades que contribuem para essas emissões, incluindo o desmatamento desenfreado.
Essa percepção é um consenso razoável, e pode ser confirmada pela quantidade de metas provocadoras. Percebemos uma mudança no tom e na seriedade com que este assunto deverá ser tratado daqui em diante. Aparentemente não há mais espaço para negacionismo climático e ambiental, e as contrapartidas necessárias para financiamentos e cooperação internacional serão exigidas com rigidez inédita.
O Brasil também apresentou suas metas, embora não tenham sido propostas mudanças significativas em relação ao que já havia sido apresentado em encontros anteriores:
- Obter “neutralidade climática” até 2050 (antecipação de 10 anos em relação à meta anterior)
- Zerar o desmatamento ilegal até 2030
- Reduzir em quase 50% das emissões até 2030
- Duplicação dos recursos destinados a ações de fiscalização.
Com exceção da primeira na lista acima, as demais metas já foram estabelecidas e comunicadas anteriormente, motivo pelo qual o discurso do líder brasileiro não provocou o “frisson” que dele se esperava.
O anúncio de que se pretende “duplicar os recursos destinados a ações de fiscalização”, além de não estabelecer a origem de tais recursos e não estabelecer um prazo para este aumento significativo, contradiz as ações que vêm sendo tomadas até agora. No exato momento em que ocorre a Cúpula de Líderes para o Clima, servidores do Ibama denunciam que fiscalização ambiental está paralisada devido a mudanças nas regras de aplicação de multas o que, na prática, inviabiliza as atividades de fiscalização, tornando-as inócuas.
Sobre a meta de “zerar o desmatamento ilegal até 2030”, convém ressaltar o fato de que ela pode ser alcançada tanto pela redução efetiva do desmatamento (muito difícil, mas necessária) ou na manobra legislativa de aumentar o número de modalidades de desmatamentos “legais”.
No caso do Brasil, as implicações do “descuido ambiental” (eufemismo meu) e do consequente descumprimento das metas são múltiplas. Além o óbvio impacto na biodiversidade, qualidade de vida e esgotamento de recursos naturais, a economia será (já está sendo) seriamente afetada sob diversos pontos de vista: restrições a compra de produtos brasileiros, redução no interesse do turismo (já levado praticamente a nocaute pela pandemia de COVID-19), redução na oferta de financiamento internacional e desinteresse por investimentos em negócios brasileiros. A economia ESG (Environmental, Social, Governance ou Ambiental, Social e de Governança) é uma expressão do interesse dos diversos atores do mercado e é um caminho sem volta para nações e organizações que pretendem obter e manter protagonismo em suas áreas de atuação.
O aceno proposto durante a Cúpula de Líderes para o Clima é positivo, mas devemos acompanhar de perto a execução das ações necessárias para o cumprimento de tais metas. Entre a promessa e a ação existe um abismo enorme, onde escondem-se interesses políticos e ideológicos, limitações orçamentárias e incompetência gerencial. Nesse sentido, podemos esperar ainda maior pressão na Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas (COP26) — que será realizada em Glasgow (Reino Unido) entre os dias 01 e 12 de novembro de 2021 que, além de outros, terá o objetivo de acelerar a ação climática para cumprir o Acordo de Paris
Flavio Oliveira
flavio.oliveira@pmanalysis.com
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